Com um modelo de gestão peculiar a rede é sucesso de público no Brasil, onde tem faturamento por loja superior aos EUA, o país de origem
Por Flávia Gianini
“O segredo são os funcionários.” Para qualquer pessoa que já tenha sido empregada em algum momento da vida a afirmação pode soar como demagogia. E não é para menos. O ato de incluir nos discursos as paixões populares parece ter deixado de ser monopólio da política e entrado de vez no mundo corporativo, com o uso constante de termos como colaboradores, valorização do capital humano, abertos a novas ideias, entre outros.
Mas no caso da rede de restaurantes Outback Steakhouse, deve ser verdade. Para chegar a essa conclusão basta analisar o modelo do negócio, que cresce em média 20% ao ano no Brasil. Para começar, o Outback não é uma franquia. Para se tornar um empreendedor da rede é preciso ter expertise no setor, e cerca de R$ 60 mil no bolso. Um valor quase irrisório para uma unidade do setor de alimentação que, em geral, começa a partir dos seis dígitos. Também ajuda, e muito, trabalhar lá. Mais de 60% vieram do staff do restaurante, e começaram como garçons, garçonetes ou gerentes.
Nome na porta
Quem se torna sócio-gestor tem seu nome gravado na porta da unidade que administra, recebe um salário fixo, que gira em torno de R$ 10 mil por mês, e mais uma porcentagem do faturamento líquido do restaurante que, segundo especialistas do mercado, é de cerca de 8% do total. O contrato com o sócio-gestor é de cinco anos, e pode ser renovado. Ao final de cada contrato, a rede “compra” a posição do gestor, mas mantém o valor do acerto a sete chaves.
É um bom negócio. Apesar de ficar com a maior parte do lucro, a rede entrega ao sócio uma loja pronta para funcionar. O investimento em uma unidade do Outback é de aproximadamente R$ 5 milhões. A rede não revela números, mas especialistas calculam que seus mais de mil restaurantes em 22 países têm receita de US$ 4 bilhões por ano, sendo que as 850 lojas nos EUA são responsáveis por menos de R$ 3 bilhões, e as restantes, incluindo o Brasil, pelo restante. Ou seja, menos de 6% do total representa 30% da receita.
Brasil: líder de faturamento por loja
“O faturamento das unidades líderes brasileiras é, no mínimo, 10% maior do que o do restaurante número 1 em vendas nos Estados Unidos”, afirma o presidente do Outback Brasil, o libanês Salim Maroun. Se for mesmo assim, um sócio-gestor pode embolsar até R$ 400 mil/ano.
“O sucesso do nosso trabalho é o sucesso das nossas pessoas. Manter as promessas que fazemos provou ser um bom negócio. Damos a chance de eles fazerem uma carreira dentro do Outback. A longevidade do funcionário permite o crescimento da empresa e o crescimento da empresa, por sua vez, nos permite recompensar a fidelidade dos funcionários”, resume Maroun.
O presidente da rede no País se orgulha em dizer que nunca perdeu um sócio e é capaz de falar de cabeça, e sem esforço, o nome e sobrenome dos 34 responsáveis por cada uma das unidades no Brasil, quem são seus respectivos cônjuges, filhos e onde moram. “Eles são escolhidos para ficar para sempre”, diz.
Devagar e sempre
Mas o melhor termômetro sobre o desempenho da rede no Brasil são as enormes filas de espera nas portas dos restaurantes. Sentar em uma das mesas do Outback nos fins de semana pode demorar duas horas.
Maroun recusa, entretanto, usar a palavra sucesso. “É perigoso ser guiado pelo sucesso. Por isso eliminei a palavra do meu dicionário”, diz. Segundo ele, a estratégia da empresa é construir uma base sólida para poder crescer de maneira sustentável. “Eu estou com tanta pressa que vou devagar”, brinca.
Ao lado do norte-americano
Peter Rodenbeck, Maroun é responsável pela improvável operação centralizada e sem franquias do Outback Brasil, que é uma joint venture entre eles e o Outback International. Segundo Salim, tanto ele quanto Peter aprenderam administração na melhor escola possível. Ambos eram franqueados do
McDonald’s.
Salim Maroun viveu no Canadá até vir para o Brasil, em 1996, depois de uma breve passagem pelo Líbano, sua terra natal. Lá, tentou abrir uma loja da rede, mas desistiu por conta da situação política instável. Morar no Brasil não estava nos planos, mas veio, a convite de Peter e dois anos depois o Outback começava a funcionar. “Acredito no modelo”, diz ele, que, apesar da fé na rede, não tem nenhuma loja sob sua responsabilidade. É uma espécie de sócio majoritário da praça paulista, enquanto Peter se concentra no Rio de Janeiro.
Crescimento sólido
Nos primeiros dez anos de Brasil foram inauguradas 18 lojas. Nos últimos quatro anos, porém, esse número quase dobrou. “Estávamos formando os futuros sócios. Nós não construímos um restaurante antes de termos alguém”, explica. Mas o crescimento sólido encoraja o libanês de alma cigana a fincar pé de vez no País. “O Brasil é abundante em produto e em mão de obra, itens fundamentais para o setor de alimentação.”
Ele só reclama da falta de infraestrutura. “A maior dificuldade é logística. Transportar alface em caminhões em um país com as dimensões e as estradas do Brasil é uma coisa complicada”, afirma. Mas nem assim ele desanima. Esse libanês tem alma de brasileiro e não desiste nunca. Diante de qualquer dificuldade trabalha ainda mais, em geral das 8h às 20h e diz que nunca tirou férias de verdade. “
Excelência é um hábito, não um objetivo”.
Nas poucas horas de folga, ele gosta mesmo é de ler, principalmente filosofia, área na qual é formado. Nas suas mudanças pelo mundo faz questão de carregar os cinco mil títulos que guarda em sua biblioteca. Morando há pouco tempo em São Paulo, vive com a família na ponte aérea entre a capital paulista e a Cidade Maravilhosa, onde ainda mantém casa. “Adoro o Rio e também amo o dinamismo e as possibilidades de São Paulo”, conta.
Paixão pelo Brasil
O empresário é enfático quando fala do apreço ao Brasil. “Esse é um dos trabalhos mais difíceis que existem. Quando as outras pessoas estão de folga, nós estamos trabalhando. Nos feriados, trabalhamos. Nas madrugadas, trabalhamos. Nas festas de fim de ano, trabalhamos. Mesmo assim, os brasileiros atendem com um sorriso no rosto. Visito restaurantes pelo mundo todo. Nenhum lugar tem um atendimento afetuoso como aqui”, resume ele, com conhecimento de causa.
Para confirmar o que diz, ele conta. “Eu estava há três anos no Canadá. No dia 24 de dezembro fui a uma livraria e comprei três livros. Pedi para entregar em casa no mesmo dia. Para mim, o mais importante não eram os livros. Eu queria que pelo menos no Natal alguém fosse na minha casa. Foi a única visita que eu recebi em todo tempo que estive lá. Mas, desde que cheguei aqui, as pessoas me recebem de braços abertos. Você só sabe o valor disso, quando vive sem”, diz Maroun, que se emociona ao lembrar do episódio e diz, novamente, como está satisfeito com o Brasil. “A vida é cheia de surpresas que você não planejou”, garante.
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